sexta-feira, 30 de novembro de 2018

XI- FUGIR À MORTE TODOS OS DIAS CANSA – A ternura dos "entas" e tais...


Esta é aquela fase da vida em que os filhos continuam a crescer em tamanho, em peso, e nos disparates.
Esta também é aquela fase da vida que os adultos têm menos paciência para MERDAS, mas como não querem esticar já o pernil puxam o autoclismo, mental ou verbalmente.   
Esta fase coincide com a abertura do baú “de desejos falhados ou por concretizar”. Momento em que pensamos que agora sim, agora é que vamos fazer AQUELE curso, aprender a tocar um instrumento, aprender a cantar, tirar a carta de condução, ou ainda uma formação para atores amadores, no meu caso é a altura para fazer um curso de sapateado.
É também, neste momento da vida, que pensamos que agora já podemos fazer AQUELA viagem, sozinha, com amig@s, ou a dois, porque os filhos já não querem fazer férias connosco. CERTO?
ERRADO!
Quando a prole ouve que é uma viagem à Patagónia não só nos DIZEM que nos vão acompanhar como também nos INFORMAM que já convidaram @s vadi@s d@s namorad@s para irem connosco… e descobrimos rapidamente que o aumento de pessoas no pacote turístico afinal só nos permite ir de férias até à Isla Cristina.

Pensamos também que vamos conseguir descansar mais porque eles já têm chave de casa e podem entrar e sair sem nos incomodar… mas os transportes estão caríssimos e se gastam no táxi não podem comprar álcool, e assim DECIDEM que o melhor é acordar um dos progenitores para proceder à recolha e distribuição da “carga”.
É também nesta fase que resolvemos que vamos sair mais, fazer jantares com amigos, saídas pela madrugada afora, cinema, teatro, passeios, passar tempo com os nossos amigos… e quando pegamos no telemóvel descobrimos que alguns dos nossos amigos ou mudaram de vida, ou de país, ou de casa, ou de sexo, ou padecem de alguma maleita e ainda outros deixaram-se apanhar pela figura da ceifa na mão!  

Não sei se se recordam da Rita, mas a Rita para além de porreira é uma inspiração. Uma das grandes virtudes que caracteriza a Rita, é a sua insensibilidade para merdas, não tem feitio para isso. Aliás nunca teve!
Há uns tempos atrás ligou-me e disse: “Temos que ajudar a J. Temos que sair com ela e animá-la porque o estupor do G. pediu-lhe um tempo. Eu dava-lhe com o tempo, e com tudo o que tivesse à mão, naquela careca. Sabes bem que nunca o suportei!”
Respondi “Claro que sim Rita, aliás sei eu e todos os convidados do casamento deles, onde gritaste: ó tiras a mão daí ou parto-te o braço! Ainda hoje se comenta isso!”
No fim do telefonema fiquei contente com a sua preocupação com a J.. Sempre ouvi que “ser mãe” torna as mulheres mais sensíveis e senti que a Rita estava nesse ponto, naquele de ouvir uma amiga que precisava de desabafar.
Combinamos fazer uma peregrinação pelo Bairro Alto, de tasca em tasca, porque precisávamos de recuperar a nossa fé. Eu cheguei com a J. e a Rita chegou mais tarde, mas ainda a tempo de apanhar a J. a chorar. A Rita pediu duas imperiais e bebeu-as uma atrás da outra. Perguntou se já tínhamos pedido alguma coisa e tratou de pedir por nós e de manter a mesa sempre cheia de álcool. E dizia para a J. “podes contar sempre comigo para te encher o copo” e assim o fez durante toda a noite. Às páginas tantas perguntei-lhe “Rita não queres ouvir o que ela tem para dizer? Não foi por isso que viemos?”
A Rita disse: “ Não, nós viemos porque esta é a desculpa perfeita para sair de casa e deixar os 4 putos com o pai. E o pai não pode contestar porque eu tenho o argumento certo do meu lado: “Olha o que ele lhe fez? Os homens não valem nada. Ficas a dever-me uma. E ai de ti que venhas com essa do “preciso de um tempo!”
As separações acontecem e por diferentes razões. Umas porque mudam de tendência sexual, outras porque se apaixonaram por outras pessoas, outras porque se apaixonaram por si e descobriram que merecem mais na vida, outras que começaram a cultivar um enorme apreço por sossego, e acrescentar a isto tudo a má qualidade dos jogos de futebol que em nada contribuem para alegrar o seio familiar.

Descobrimos que existem pessoas que não estão bem com a vida que têm e gostam de desportos radicais por isso arranjam namorad@s consideravelmente mais nov@s. Porque dizem ser men@s chat@s, são mais compreensiv@s e não procuram defeitos. E depois surge o dia em que começam a viver juntos e que por vergonha escondem como foram intrujad@s. E com os segundos casamentos vêm os segundos filhos. E aquela paz que havia cada quinzena com a guarda partilhada desaparece. Todos os fins-de-semana são fim-de-semana com crianças, volta tudo ao mesmo, mas com mais crianças e mais anos em cima. Menos cabelo, menos audição, menos dentes, menos visão, e menor desempenho.

E fazer uma árvore genológica com esta miscelânea de relações? Dá uma tese de doutoramento!


Sempre que saímos com amigos, e que os nossos amigos diziam: “agora comecei a correr” ou “agora inscrevi-me no ginásio” a Rita respondia: “então? andas a fugir do quê?” “O clima lá em casa está pesado?” ou “andas a malhar? Ou andam a malhar em ti?” Ficava um ambiente super-pesado com as insinuações que ela fazia que só se dissipava após a terceira imperial.
Um dia a Rita liga-me e diz: “adivinha o que eu descobri no bolso do B.?”
Eu: Droga?
Rita: “Também, aliás fumei e agora estou à espera que ele chegue a casa.”
Eu: Pedido de adesão para membro do Partido Social Teocrata?
Rita: Pior!
Eu: Um cartão de aficionado de tauromaquia.
Rita: Não chegas lá… pior do que isso! Um Cartão do Holmes Place. Acreditas que ele anda no Ginásio?
Tentei tranquilizar a Rita, a situação era grave e disse: “Deve haver uma explicação!”
No dia seguinte a Rita liga-me e diz: “Não passou de um susto, afinal o cartão não é dele, é de um amigo”
E este foi um assunto que nunca mais revisitámos!

Nesta fase da vida em que preferimos o mate ao brilho, precisamos de ter um ou vários médicos, começamos a responder “sim” às perguntas “toma alguma medicação?” e também ao “queixa-se de alguma coisa?”.
E quando nos fazem esta pergunta não querem saber se nos queixamos dos companheiros, dos filhos ou dos vizinhos, é mesmo se dormimos bem, se os pés nos incham… entre tantas outras coisas…
As conversas deixam de ser sobre os filhos (porque estes nos proibiram de falar deles), passam a ser sobre o estado de saúde dos nossos pais e das nossas enfermidades.
Mas importa falar, não importa do que, desde que continuemos a falar é sinal que continuamos a seguir o plano de nos mantermos em fuga.
Nesta fase da vida, os adultos assustam-se… com a contagem dos “entas”, e depois começam a repetir em voz alta que nunca gostaram tanto de si como acontece nesta fase da sua vida.
E por gostarem tanto de si começam por consultar cirurgiões plásticos, contratar um personal trainer (PT), fazer viagens de interiorização espiritual, organizar grupos de treino ou de caminhadas e tudo para fugirem aos que o realmente os assusta. (Nos assusta!) A proximidade vocês sabem do quê…
Fascina-nos a juventude e vamos nos movendo de forma a passarmos por mais novos, aliás há quem comece a escrever manuais de ajuda!
Cada um passa por esta fase de formas diferentes. Uns agarram-se ao que têm, outros procuram por algo que os realize, e como diz a música não são os únicos.
Importante é ter bem vigiada a visão, e para isso serve um bom oftalmologista. Sim é importante ter a saúde vigiada por bons profissionais, mas o mais importante na vida, aquilo que nos dá saúde, é mantermos por perto as melhores pessoas que conhecemos. E mantermos distantes todas aquelas que nos deixam doentes.  
Necessitamos de bons profissionais para cuidarem da nossa saúde e da nossa aparência, mas precisamos muito mais das pessoas que nos alimentam a alma.
Nesta fase da vida já aprendemos o quão importante é ter uma postura correta, e começamos a andar direitas. Já não deixamos que muitas coisas nos verguem.
Tentamos andar com a cabeça levantada e costas direitas a maior parte do tempo, e tão direitos que andamos que não vemos a enorme a poia que estava mesmo à frente, e bastava termos olhado para baixo.
E é isto mesmo, por melhor que pareça já sabemos que o melhor é aproveitar o momento porque em breve ou iremos pisar, ou irá chover, porcaria.
Mas estamos vivos!